Escrevo estas reflexões no dia em que a Humanidade terá atingido o número gordo de sete mil milhões de habitantes, muito provavelmente na Índia, o segundo país mais populoso do Mundo, antes de destronar, nesta competição, a China, facto projectado para os próximos anos 20.
Hoje (anteontem para quem lê este texto no dia da publicação do jornal), ainda registo algumas mensagens contidas nas leituras do fim-de-semana, nomeadamente uma, de alguém que considero, a lembrar que Portugal concedeu licenças de construção suficientes para alojar todos os espanhóis.
Já não ouvia esta projecção, verdadeira e apocalíptica, há muito. É verdade que de acordo com os planos directores municipais de Portugal seria possível construir imóveis para mais de 40 milhões de pessoas, ou seja, quatro vezes mais a população que actualmente somos. Não todos, mas muitos espanhóis.
Seria possível cimentar o país até essa quase exaustão, mas não foi o que aconteceu, pelo bom senso do mercado (uma auto-regulação natural) e sem necessidade de um recurso emanado de cima, do Estado, tipo numerus clausus para a construção, cenário a que já me referi em tempos.
Na projecção contrária – a de dar alojamento aos espanhóis, a quase todos os espanhóis – talvez pudéssemos falar de uma bolha imobiliária, se bastasse para a identificar conferir se o valor dos bens imobiliários ainda cobre o valor do crédito obtido para os adquirir.
Num quadro de escassez de recursos, os homens de negócios, entre os quais me incluo, como empresário, devem olhar mais para os homens, aqui considerando homens e mulheres de todas as condições, do que para os negócios, se o lucro que visam atentar contra o interesse do público alvo.
Repito o que tenho vindo a dizer desde o recente Salão Imobiliário de Portugal: é na lucidez da apreciação daquilo que podemos ou não sacrificar que residem as diferenças nas opções políticas. Em todos os aspectos da vida, evitando, a todo o custo, o sacrifício para as pessoas.
Seja nos cortes cegos das sempre pequenas benesses que são atribuídas à generalidade das pessoas, seja na desvalorização dos bens que muitas pessoas foram construindo, como bens de uma vida, como acontecerá, entre nós, quando diminuirmos rendimentos e aumentarmos encargos.
A tentação de olhar menos para os homens e mais para os negócios, sejam eles públicos ou privados, é um paradigma perigoso quando, por exemplo, esticamos a corda a cortar benefícios às pessoas e a obrigá-las a pagar muito mais por compromissos que assumiram noutros contextos.
Até mesmo a China que evitou, com a sua política de limitação de nascimentos, que a humanidade contabilizasse hoje sete mil e quatrocentos milhões de pessoas, sente necessidade de seguir, gradualmente, outros caminhos menos restritivos. É que nunca poderá haver bolha humana.
Luís Lima
Presidente da APEMIP
luis.lima@apemip.pt
Publicado no dia 02 de Novembro de 2011 no Público