A vários milhares de quilómetros de Portugal sinto o peso das linguagens que usamos no nosso apressado economês e reconheço o quão injustas e pouco rigorosas podem ser certas palavras que foram entrando no nosso vocabulário, entre as quais a palavra “lixo” tantas vezes utilizada pelas agências de rating para classificar a nossa dívida pública e tantas vezes por mim combatida.

Na verdade, as dívidas soberanas não são “lixo”, mesmo que não interessem a alguns investidores mais vocacionados para especulações rentáveis como também nenhuma casa é “lixo”, mesmo que desespere por algum interessado que realmente tarda a aparecer, numa demora justificada no menor interesse na localização que lhe calhou, quando se construía como se não houvesse amanhã.

Hoje, que a informação galga fusos horários em segundos, ver o impacto que uma expressão, quase proferida por inércia, pode ter faz-me refletir sobre o poder da comunicação e sobre os cuidados que os comuns mortais como eu devem assumir sempre que comunicam e principalmente sempre que o fazem para grandes audiências.

Embalado na facilidade do economês, não transmiti, como realmente desejava e penso, a verdadeira dimensão do mercado imobiliário português que já não é exclusivamente marcado pela oferta dos ativos imobiliários que “regressaram” às instituições financeiras por força das dações de imóveis feitas por particulares e empresas em incumprimentos de contratos.

Na verdade, repetindo o que é justo que se repita, penso que nenhuma casa é “lixo”, nem mesmo aquelas que vão demorando a encontrar novos proprietários ou primeiros arrendatários, por estarem situadas em zonas menos procuradas por quem, atualmente, procura soluções habitacionais e tem condições para aceder ao crédito.

As melhores ofertas no universo dos ativos imobiliários que “regressaram” aos respectivos financiadores já se encontraram com novas procuras, restando como é natural, as menos bem localizadas que agora voltam a sofrer a concorrência da oferta “normal”, ou seja, da oferta que não está condicionada pela marca do imóvel “devolvido”, com todas as consequências boas e menos boas.

Nem os casebres em ruínas são “lixo” pois, em muitos casos, são desafios interessantes para reconstruções, reabilitações e regenerações urbanas e urbanísticas e, nesta perspectiva, foi até aprovado recentemente pelo nosso Governo um programa de apoio a este mercado. Investir no imobiliário pode ser mais seguro do que investir em ouro, como aliás disse na mesma ocasião em que usei economês em excesso.

Também é minha convicção que as instituições financeiras vão, e a breve prazo, voltar a financiar a aquisição de imóveis mesmo quando os clientes a solicitam para casas que não fazem parte dos ativos que essas mesmas instituições financeiras ainda possuem. Isto será bom para todos, para a Economia do país, para os portugueses e, em consequência, para a própria banca. Isso será o sinal definitivo de que o mercado imobiliário voltou a funcionar em normalidade.

Luís Lima
Presidente da CIMLOP
Confederação da Construção e do Imobiliário de Língua Oficial Portuguesa
presidente@cimlop.com

Publicado no dia 19 de março de 2014 no Público

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